MANIFESTAÇÃO DO SAERJ SOBRE A DECISÃO DO STF QUE SUSPENDEU OS PROCESSOS NA JUSTIÇA DO TRABALHO NO TEMA 1.389 DE REPERCUSSÃO GERAL

25/04/25

Sessão em abril do STF (foto: Luccas Zappalá/STF)

O Sindicato dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro (SAERJ) vem a público analisar recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF): no dia 14 de abril de 2025, o Ministro Gilmar Mendes do STF suspendeu, até o julgamento do mérito pelo Pleno, todos os processos na Justiça do Trabalho com pedido de vínculo de emprego em casos de fraude à lei trabalhista, quando o empregado é obrigado a forjar uma pessoa jurídica, para o contratante escapar das obrigações trabalhistas – a chamada “pejotização”.

O caso, o Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.532.603/PR, já havia ganhado Repercussão Geral (Tema 1389), no qual será apreciada a “Competência e ônus da prova nos processos que discutem a existência de fraude no contrato civil/comercial de prestação de serviços; e a licitude da contratação de pessoa jurídica ou trabalhador autônomo para essa finalidade”

Assim, o julgamento envolveria não só a validade jurídica dos contratos, mas o questionamento da competência da própria Justiça do Trabalho.

Este pretenso precedente do STF é de especial importância para os advogados, pois muitos colegas advogados são submetidos à contratos de “sociedade” ou de “associação” que, ao contrário do que estabelece o artigo 39 do Regulamento Geral (previsto pelo artigo 54, V, do EOAB) – com evidente finalidade de permitir a reunião entre profissionais autônomos atuarem conjuntamente na defesa de determinado cliente ou em certa causa –, na verdade escamoteiam uma relação de emprego com grandes escritórios.

Trata-se de uma armadilha.

O reconhecimento da relação de emprego não necessita nem jamais necessitou de análise do aspecto subjetivo, de vontade das partes ou sua forma contratual, posto que a lei impõe objetivamente sua verificação através de requisitos apanhados da realidade fática.

Desta forma, a Justiça do Trabalho tem sido acusada injustamente de descumprir as decisões do STF transformadas em precedentes obrigatórios.

Não é verdade.

A Justiça do Trabalho tem rigorosamente respeitado os Precedentes da Suprema Corte, especialmente aqueles que tratam da terceirização – a ADPF 324 e o Tema 725 – que estabelecem a liberdade das empresas de contratarem serviços por meio desta modalidade de empresa interposta.

Ocorre que os casos sobre fraude de “pejotização” não estavam abrangidos pelos Precedentes, apesar de uma enxurrada de Reclamações Constitucionais terem inundado o Supremo, com julgados muitas vezes açodadamente equivocados quanto à aderência do precedente às decisões acusadas de insubordinadas, e, equivocadas também quanto a extensão da vinculação dos precedentes para além do caso-base que o determinou e de sua ratio decidendi.

O que a Justiça do Trabalho tem feito é simplesmente cumprir a Lei e, sobretudo, a Constituição, e seu conjunto de normas de proteção aos trabalhadores, erigidas ao patamar de Direitos Fundamentais, e, cláusula pétrea.

A discussão sobre existência ou não de vínculo de emprego não se esgota nem depende da discussão sobre vício de consentimento na formalização do contrato. Depende da prova da presença dos requisitos fáticos que caracterizam o empregado, segundo a Lei.

Tampouco há que se falar em qualquer alteração de competência da Justiça do Trabalho, eis que é de conhecimento comezinho da lei que a competência é definida pela causa de pedir e pelo pedido contido na petição inicial, e confirmada pelas provas produzidas, pouco importando solenidades jurídico-formais ocorridas.

É uma questão fática, de reanálise de provas que, por si só, já indicaria a impossibilidade de atuação do Supremo Tribunal Federal e sua competência recursal de natureza extraordinária (muito menos de ônus da prova como pretende o Tema 1389). O respeito à Constituição recomendaria a prática de autocontenção pela Suprema Corte.

Autocontenção que poderia ter sido experimentada inclusive no julgamento liminar que suspendeu milhares de processos, grande parte pleiteando verbas de natureza alimentar, na Justiça do Trabalho, apenas com base numa suposta divergência jurisprudencial sobre a “pejotização”, que, de fato, é mínima (revelando argumento irrazoável para a decisão do Ministro Gilmar Mendes).

Ademais, é a própria Constituição que define, com clareza diáfana, no artigo 114, I, a competência da Justiça do Trabalho para tais casos em que se discute a relação de trabalho. Só a Justiça do Trabalho tem competência para decidir sobre a existência ou inexistência de vínculo empregatício.

Esperamos que o episódio sirva para que o Supremo Tribunal Federal pratique autocontenção e, como guardião da Constituição, submeta-se a ela em sua inteireza, especialmente às normas jusfundamentais de proteção aos trabalhadores e de competência da Justiça do Trabalho, e, assim, reencontre sua legitimação inclinando-se à soberania popular plasmada na Constituição.

Claudio Goulart e Ivan Garcia – Presidente e Procurador do SAERJ