DO SITE JUSTIFICANDO:
Artigo do juiz do TRT-RJ Cláudio Montesso, ex-presidente da Associação Nacional dos Juízes do Trabalho (Anamatra):
Reforma Trabalhista trouxe oportunidades para Juízes do Trabalho serem cruéis
“As novas normas trabalhistas entraram em vigor em um sábado de novembro. Sua aplicação imediata aos processos já ajuizados, instruídos e/ou prontos para julgamento ainda era uma controvérsia, mas houve magistrado que, no próprio sábado, talvez até esperando virar o relógio para isso, fez publicar sentença que condenava empregado a pagar honorários e danos por litigância de má-fé ao empregador.
“Antes mesmo da vigência da lei houve os que, antecipando-se e dando a elas efeito retroativo inexplicável, determinaram que a petição inicial fosse emendada para adequação à exigência que viria. Outros, mesmo depois de contestado o feito, mandaram retirar defesa e documentos do processo e a parte autora vir com nova inicial adaptada à lei nova, de nada importando que tudo, inclusive a defesa, tenha sido praticado antes de sua vigência.
“E ainda houve quem, no afã de dar um exemplo, seja lá do que for, alterou de forma aleatória e arbitrária o valor da causa, só para que a condenação da parte autora nos honorários de sucumbência, fosse superior ao eventual crédito que ela viu reconhecido naquela mesma sentença. Até em sede de recurso se condenou em sucumbência processo cuja sentença foi anterior à norma em questão.
“Haverá os que defendam tal posicionamento e que tudo é uma questão de entendimento. Pode até ser que sim, mas o entendimento em questão na realidade está muito mais a serviço de uma espécie de crueldade ou uma vingança de caráter pessoal do que daquilo que se convenciona chamar de Justiça. Para quem lê tais decisões e conhece os meandros do Judiciário, dá para perceber um certo sadismo na interpretação da lei ou no entendimento que se quer defender. Algo como uma vingança, uma revanche, um desagravo. Como se a parte, ao vir a juízo, com ou sem razão (em determinados momentos isso ainda não é possível vislumbrar) estivesse agredindo o juiz, prejudicando o magistrado, criando embaraços ao Judiciário.
“Em alguns momentos parece que o desejo de vingança não é contra a parte, que o juiz, muitas vezes, nem sabe quem é, mas contra a advocacia. Como se ela fosse a responsável pelo fato de alguém ter tido ou achar que teve seus direitos violados e viesse onde aguardava ser satisfeita. Há um deliberado esquecimento de que o direito de ação pode e deve ser exercido sem que seja certo o direito material controvertido. Do contrário não seria necessário o próprio Judiciário.
“Nem se alegue que há casos em que os pedidos são absurdos e manifestamente improcedentes, pois no caso há remédio próprio para isso e não é preciso esperar o relógio marcar um minuto do sábado, dia 11 de novembro, para poder aplicar as sanções processuais cabíveis.
“Há um comportamento autofágico nisso tudo. Em alguns momentos parece que a intenção é mesmo fomentar uma discussão sobre a própria necessidade do juiz e do aparato judicial. Isso porque tais comportamentos contribuem, e muito, para o desprestígio do próprio Poder Judiciário. Fica o registro para a sociedade de que, se quiser, o juiz pode ser tudo, menos justo. Pode ser arbitrário, inconsequente, irresponsável e maquiavélico. E nada lhe acontece.
“Mas ainda assim haverá quem, se identificando com o outro lado que foi beneficiado por esse comportamento, aplaudirá. Bem, há outros exemplos por aí, em outras áreas. Se é para pegar quem eu não gosto, dane-se o Direito e a Justiça.
“Fica-se com a impressão que os juízes foram contaminados por um sentimento de justiçamento midiático, que exige mais do que a própria lei determina, sob pena de haver uma sensação de impunidade. Ou então de que o culpado pela sua quantidade de trabalho e seus finais de semana perdidos é sempre quem, possivelmente, é apenas vítima. O resultado, no entanto, é justamente o oposto, apenas a Injustiça ou a não Justiça.
“Ou talvez seja apenas um caso para a psicanálise. Se for, haja divã.”