Sérgio Batalha Mendes, diretor do Sindicato dos Advogados-RJ, publicou artigo na última sexta-feira (14), no jornal O Dia.. No texto, ele critica o comentário do presidente eleito de que “é difícil ser patrão no Brasil”. Leia o artigo a seguir:
Sérgio Batalha: ‘Difícil é ser trabalhador no Brasil’:
O presidente eleito Jair Bolsonaro declarou recentemente que “hoje em dia é muito difícil ser patrão no Brasil”, justificando para um grupo de deputados a necessidade de “aprofundar a Reforma Trabalhista”. Insistiu na tese de que “o trabalhador vai ter que decidir, um pouquinho menos de direitos e emprego ou todos os direitos e desemprego”, acrescentando que a Reforma Trabalhista foi boa “porque dificultou o acesso à Justiça do Trabalho”.
São declarações que surpreendem aqueles que conhecem a realidade brasileira, especialmente vindas de quem terá a missão de ser presidente de todos os brasileiros.
Em primeiro lugar, a tese de “menos direitos e mais empregos” foi desmentida pelos dados econômicos posteriores à Reforma Trabalhista. Decorrido um ano após a retirada de vários direitos dos trabalhadores, a geração de empregos foi pífia no período, menos de 300 mil empregos gerados contra os dois milhões prometidos por Temer antes da aprovação reforma. Houve um aumento da informalidade no mercado de trabalho e os poucos empregos gerados corresponderam ao pequeno crescimento do PIB no período.
Há um consenso entre os economistas no sentido de que o que cria emprego é o crescimento econômico e não uma legislação trabalhista mais favorável ao empresário. Ao contrário, o efeito econômico da retirada de direitos do trabalhador é o encolhimento da massa salarial, provocando uma redução do consumo das famílias e, consequentemente, um efeito recessivo sobre a economia.
O salário médio do trabalhador no Brasil em 2017 foi de R$ 2.112, sendo que o salário médio do trabalhador em Portugal equivale a R$ 6.672,40 e no Chile a R$ 4.730,35. Metade dos trabalhadores brasileiros tem um salário médio equivalente a R$ 754.
Por outro lado, o trabalhador brasileiro convive, além dos baixos salários, com o desrespeito cotidiano dos seus direitos trabalhistas. As estatísticas do Justiça do Trabalho revelam que em mais de 90% das ações trabalhistas há o reconhecimento de um direito sonegado ao trabalhador, seja por sentença ou por acordo. A maior parte dessas ações trabalhistas versa sobre direitos básicos do trabalhador, como anotação do contrato na carteira de trabalho, pagamento de verbas rescisórias e horas extras. Logo, dificultar o acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho é estimular o calote do empregador no pagamento das verbas previstas em lei.
O presidente eleito deve perceber que difícil é ser trabalhador no Brasil, ganhando um salário baixo e tendo seus direitos cotidianamente desrespeitados. Agora, o trabalhador ainda se torna o bode expiatório do desemprego, como se fosse sua a culpa pelo baixo crescimento econômico. Nunca seremos uma nação desenvolvida enquanto não levarmos a sério o mandamento do inciso IV do artigo 1º da Constituição, que institui o valor social do trabalho como um dos fundamentos de nossa República.
Sérgio Batalha é advogado trabalhista, Mestre em Direito, diretor do Sindicato dos Advogados-RJ e conselheiro eleito da OAB-RJ (2019/2021)