TJ afasta juiz suspeito de pedir dinheiro a advogados

4/04/13

Do site da Folha de S. Paulo (FLÁVIO FERREIRA): Pela primeira vez em sua história, o Tribunal de Justiça de São Paulo afastou ontem um desembargador acusado de pedir dinheiro a advogados interessados em processos nos quais ele atuou.
A decisão atingiu o desembargador Arthur Del Guércio Filho, 57, e foi tomada por unanimidade pelo Órgão Especial do tribunal. O TJ de São Paulo é composto atualmente por 347 desembargadores.
Segundo testemunhas ouvidas numa investigação conduzida pelo próprio tribunal, Del Guércio procurava advogados e seus clientes dizendo ter problemas financeiros e pedia de R$ 20 mil a R$ 35 mil.
Uma das testemunhas, o advogado Clito Fornaciari Júnior, disse que, ao pedir dinheiro a um dos seus clientes, Del Guércio antecipou que iria votar a seu favor num processo e mostrou o voto.
Segundo o advogado, o juiz acrescentou que outros desembargadores da câmara em que atuava não queriam votar como ele e pediram R$ 120 mil para mudar de ideia.
Fornaciari disse à Folha que seu cliente recusou-se à pagar e perdeu a causa. Segundo ele, no fim Del Guércio votou contra seu pedido, ao contrário do que sugerira.
A investigação sobre Del Guércio teve início com uma denúncia feita em 18 de março pelo advogado Nagashi Furukawa, juiz aposentado e ex-secretário da Administração Penitenciária de São Paulo.
Segundo Furukawa, Del Guércio lhe pediu que enviasse a seu gabinete um advogado para conversar sobre um recurso em exame no tribunal.
A advogada Fabiane Furukawa, sobrinha do advogado, foi enviada ao gabinete do desembargador. Segundo ela, Del Guércio afirmou que precisava quitar um empréstimo contraído para financiar a reforma de sua casa.
Em seguida, disse Fabiane, o desembargador anotou o valor de R$ 35 mil num papel e mostrou-o à advogada dizendo que era quanto precisava pagar até o dia seguinte.
Segundo a advogada, Del Guércio sugeriu que ela discutisse o assunto com seu cliente e desse uma resposta no dia seguinte. Além disso, de acordo com Fabiane, ele teria dito: “Não estou vinculando [a entrega do dinheiro] à decisão no processo, mas ficaria muito grato se puder me ajudar”. A advogada diz que a resposta foi negativa.
O desembargador Gilberto de Souza Moreira, da 7ª Câmara de Direito Privado, também foi ouvido pelo tribunal e afirmou que cinco escritórios de advocacia lhe relataram episódios semelhantes.
Ao votar pelo afastamento de Del Guércio, o presidente do TJ, desembargador Ivan Sartori, mencionou a existência de mensagens de texto e registros de contatos telefônicos entre as provas apresentadas contra o magistrado.
“A deplorável conduta do desembargador […] parece não ter sido fato isolado, mas coerente com uma linha de comportamento já conhecida e repudiada por seus pares”, afirmou Sartori em seu voto.
Com 30 anos de carreira como juiz, Del Guércio foi promovido a desembargador em 2005 e atuava na 15ª Câmara de Direito Público do tribunal.
Seu afastamento tem caráter provisório. O Órgão Especial do TJ abriu processo administrativo contra ele, que não foi ouvido durante as investigações e agora terá espaço para apresentar sua defesa contra as acusações.