Folha de S. Paulo: Grupo tenta reduzir poder de Peluso na presidência do CNJ

Folha de S. Paulo (LEANDRO COLON): Integrantes do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) começaram ontem a se mobilizar para reduzir os poderes que o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cezar Peluso, tem como presidente do conselho.
Um grupo de conselheiros apresentará duas propostas quando o órgão voltar ao trabalho, na semana que vem.
Uma autoriza uma comissão interna a tomar a iniciativa de fiscalizar a transparência de gastos dos tribunais federais e estaduais. A outra retira da presidência a prerrogativa de escolher e destituir o secretário-geral, cargo responsável pelo apoio técnico e administrativo do CNJ.
O regimento interno do CNJ diz que cabe à presidência do órgão fiscalizar os portais de transparência dos tribunais -com exceção do STF- e nomear o secretário-geral, função ocupada hoje pelo juiz Fernando Marcondes, homem de confiança de Peluso.
O conselheiro Marcelo Nobre, que lidera a iniciativa, conversou ontem com quatro colegas de CNJ para escrever as propostas, que serão submetidas ao plenário do conselho e só entrarão em vigor se forem aprovadas por pelo menos 8 dos 15 integrantes do órgão de controle.
A Folha teve acesso às minutas discutidas. Nobre e seus aliados acreditam ter condições de conquistar pelo menos mais quatro votos a favor da mudança, o que seria suficiente para ter a maioria no conselho.
Dois episódios levaram a essa articulação interna: a crise envolvendo a falta de transparência nos orçamentos dos tribunais federais e estaduais, que opôs Peluso e a corregedora Eliana Calmon, principalmente no caso do Tribunal de Justiça paulista, e dois recentes contratos, de R$ 44,9 milhões e R$ 8,6 milhões, assinados pela administração do CNJ para a informatização do órgão.
Representante da Câmara dos Deputados no CNJ, Nobre cobrou explicações da direção do conselho em relação a esses contratos, que incluem a aquisição de uma sala-cofre sem licitação.
“Não houve da parte de ninguém da direção do CNJ, da presidência, do secretário-geral, um movimento para explicar essa situação”, afirmou. “As pessoas fazem o que querem e não justificam. Isso é inaceitável. Todos ficam sabendo pela imprensa.”
A Folha procurou ontem Peluso e Fernando Marcondes para comentar as propostas, mas ambos preferiram não se manifestar.
Pela proposta que começou a ser discutida ontem, o secretário-geral seria escolhido por votação secreta e eleito com aprovação da maioria absoluta do CNJ. A sua destituição dependeria dos votos de um terço dos integrantes do conselho.
“O secretário-geral é do CNJ, não do presidente. Essa pessoa precisa ter legitimidade”, afirmou Nobre. Para valer, a nova regra depende apenas de uma alteração no regimento interno do conselho.
Já a proposta que trata da fiscalização dos Portais da Transparência nos Estados mexeria em outra norma interna, a resolução de número 102, de dezembro de 2009, que rege o tema.
O novo texto que será colocado em votação diz que “a Comissão de Gestão Estratégica, Estatística e Orçamento do Conselho Nacional de Justiça verificará periodicamente o cumprimento” das obrigações dos tribunais.
Hoje, essa comissão pode apenas analisar os dados enviados ao CNJ e só Peluso tem autoridade para cobrar informações e determinar mudanças nos portais dos tribunais. Se a proposta de Nobre for aprovada, a comissão, que é formada por cinco conselheiros do CNJ, também poderia tomar essa iniciativa.

Ministro do Supremo beneficiou a si próprio ao paralisar inspeção

Folha de S. Paulo: O ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), está entre os magistrados que receberam pagamentos investigados pela corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) no Tribunal de Justiça de São Paulo, onde ele foi desembargador antes de ir para o STF.
Lewandowski concedeu anteontem uma liminar suspendendo a investigação, que tinha como alvo 22 tribunais estaduais. O ministro atendeu a um pedido de associações como a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), que alega que o sigilo fiscal dos juízes foi quebrado ilegalmente pela corregedoria, que não teria atribuição para tanto.
Por meio de sua assessoria, Lewandowski disse que não se considerou impedido de julgar o caso, apesar de ter recebido pagamentos que despertaram as suspeitas da corregedoria, porque não é o relator do processo e não examinou o seu mérito.
A liminar que ele concedeu suspende as inspeções programadas pelo CNJ e permite que o relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, volte a examinar a questão em fevereiro, quando o STF voltará do recesso de fim de ano.
A corregedoria do CNJ iniciou em novembro uma devassa no Tribunal de Justiça de São Paulo para investigar pagamentos que alguns magistrados teriam recebido indevidamente junto com seus salários e examinar a evolução patrimonial de alguns deles, que seria incompatível com sua renda.
Um dos pagamentos que estão sendo examinados é associado a uma pendência salarial da década de 90, quando o auxílio moradia que era pago apenas a deputados e senadores foi estendido a magistrados de todo o país.
Em São Paulo, 17 desembargadores receberam pagamentos individuais de quase R$ 1 milhão de uma só vez, e na frente de outros juízes que também tinham direito a diferenças salariais.
Lewandowski afirmou, ainda por meio de sua assessoria, que se lembra de ter recebido seu dinheiro em parcelas, como todos os outros.
O ministro disse que o próprio STF reconheceu que os desembargadores tinham direito à verba, que é declarada no Imposto de Renda. Ele afirmou que não entende a polêmica pois não há nada de irregular no recebimento.
A corregedoria afirmou ontem, por meio de nota, que não quebrou o sigilo dos juízes e informou que em suas inspeções “deve ter acesso aos dados relativos à declarações de bens e à folha de pagamento, como órgão de controle, assim como tem acesso o próprio tribunal”.
No caso de São Paulo, a decisão do Supremo de esvaziar os poderes do CNJ suspendeu investigações sobre o patrimônio de cerca de 70 pessoas, incluindo juízes e servidores do Tribunal de Justiça.
Liminar concedida anteontem pelo ministro Marco Aurélio Mello impede que o conselho investigue juízes antes que os tribunais onde eles atuam analisem sua conduta -o que, na prática, suspendeu todas as apurações abertas por iniciativa do CNJ.
No caso de São Paulo, a equipe do conselho havia começado a cruzar dados da folha de pagamento do tribunal com as declarações de renda dos juízes. O trabalho foi paralisado ontem.