Nassif: Os motivos de Joaquim Barbosa não dar prazo para a defesa

Artigo do jornalista Luis Nassif: Não se iludam os Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) com a aparente unanimidade da mídia em relação ao julgamento do mensalão. O enquadramento das redações e colunistas impediu manifestações maiores de dúvida sobre a isenção dos magistrados. Fosse em tempos de maior pluralidade, a mídia teria servido de freio a alguns abusos cometidos.
Além disso, todo tema complexo permite o exercício do arbítrio pelo especialista – pela óbvia dificuldade em se entrar nos meandros da discussão e identificar as vulnerabilidades das conclusões.
Quando os primeiros questionamentos foram feitos – ainda em plena efervescência do julgamento -, não foram levados a sério por indicarem inconsistências tão absurdas, que soavam inverossímeis.
Muitas pessoas com quem conversei, simpáticas a uma condenação exemplar, acreditavam que entre as dezenas de milhares de páginas do inquérito haveria evidências capazes de derrubar as críticas.
A questão é que o tempo passou, houve a oportunidade de trabalhos mais alentados e meticulosos sobre o inquérito.
Cada vez mais é evidente que a análise das acusações tem produzido dúvidas significativas nos colunistas que contam.
Mesmo com a imensa dose de cautela, compreensível nesses tempos bicudos, houve a manifestação de Elio
Gaspari, avalizando o trabalho em que Raimundo Pereira desconstrói as acusações contra João Paulo Cunha.
Direto, Jânio de Freitas explicita as enormes dúvidas em relação as acusações contra Henrique Pizzolatto.
Nenhum dos dois pode ser acusado de petista, assim como outros jornalistas de renome que, fora das grandes redações, puderam exercitar livremente sua opinião.
A indignação decorre do abuso de poder. E, como tal, são caracterizadas as ações em que os magistrados colocam sua vontade acima dos fatos analisados.
É bem possível que as agências de publicidade tivessem pago pedágio ao PT, pelas contas conquistadas. Mas não foi isso o que a acusação apurou.
Tratou como desvio a verba de publicidade da Visanet ignorando um relatório detalhado do Banco do Brasil indicando todas as fontes de aplicação dos recursos.
Atribuiu a responsabilidade total da destinação das verbas a Henrique Pizzolatto, ignorando documentos que demonstravam expressamente que as decisões eram colegiadas, com a participação de representantes de outros sócios da empresa.
Salta aos olhos de qualquer jornalista o absurdo de considerar, exclusivamente nas operações da Visanet, os BVs (bônus de veiculação, o dinheiro que as agências recebem dos órgãos de mídia onde anunciam) como indício de corrupção. E não estender esse julgamento a todo o universo de BVs. Ou não exigir a devolução do dinheiro dos beneficiados – grandes órgãos de mídia.
No caso de João Paulo Cunha, tratou como ocultação o fato de não ter ido receber pessoalmente os R$ 50 mil do PT, mas enviado a esposa, que apresentou RG e assinou o recibo. E ignorou totalmente a comprovação do uso dos recursos para pesquisas eleitorais.
A postura de Joaquim Barbosa – impedindo prazo maior para a apreciação da defesa – não se deve ao seu conhecido espírito de torquemada. É mais que isso: é receio de que as inconsistências das acusações sejam expostas agora, não mais em matérias de blogs, mas nos próprios autos do processo.
É paura, medo de uma discussão na qual o clamor da mídia não servirá mais de respaldo para o uso do poder imperial.

Projeto pode acabar com férias de 60 dias de juízes

Do site da Folha de S. Paulo: Uma comissão no STF (Supremo Tribunal Federal) analisará o texto para a criação de um novo Estatuto da Magistratura, abrindo caminho para o fim das férias de 60 dias para juízes.
Esse grupo de ministros será responsável por analisar a última versão da proposta, feita sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski.
A comissão deverá ter 90 dias para concluir os trabalhos. O plano do presidente do STF, Joaquim Barbosa, é enviar o texto da nova lei ao Congresso até o fim do ano. A informação foi divulgada ontem pelo jornal “O Globo”.
Além de temas polêmicos como as férias para os juízes, o novo Estatuto terá o objetivo de atualizar o conjunto de regras que regem a Justiça. A lei em vigor é de 1979, mais antiga que a Constituição.
A lei orgânica da magistratura não previa, por exemplo, a existência do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), órgão que regulamenta administrativamente o funcionamento dos tribunais e controla a atuação dos juízes.
Cabe ao Supremo a elaboração desse projeto de lei e a última tentativa foi em 2009 quando foi criada uma comissão para elaborar o texto.
Após ser discutido pela comissão, o texto tem de ser aprovado pelo plenário do STF e encaminhado ao Congresso.
Em 2010, quando o então ministro Cezar Peluso assumiu a presidência do Supremo, ele disse à Folha que pretendia, ainda naquele ano, encaminhar o texto ao Congresso. A proposta, contudo, sofreu resistência e não avançou na velocidade planejada por Peluso, que já se aposentou.

Alemão responsável pela tese do domínio do fato diz que acusação tem que provar

Do site da Folha (CRISTINA GRILLO/DENISE MENCHEN): Insatisfeito com a jurisprudência alemã – que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que ocupando posição de comando dava a ordem para a execução de um delito -, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.
Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.
Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.
Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.
“Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado”, diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.
Folha – O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin – O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito, tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época.
Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].
Folha – É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.
Folha – O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?
A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção [“dever de saber”] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.
Folha – A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública.

Folha: "Só falta a vitória do PT para 'lavar a alma', diz absolvido"

Folha de S. Paulo entrevista o antigo líder do governo na Câmara, ex-deputado Luizinho, que foi absolvido pelo STF no julgamento da AP 0470: 
Para o ex-líder do governo, processo não afetou o partido porque ‘o povo percebeu que tinha coisas estranhas’
Absolvido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no processo do mensalão, o ex-deputado federal Luiz Carlos da Silva, conhecido como Professor Luizinho (PT), líder do governo Lula na Câmara na época do escândalo, estava com a mulher, Ana Lucia, quando recebeu a notícia do resultado do julgamento. Ana fez aniversário na quinta.
“Toneladas saíram das nossas costas”, disse ontem à Folha. Dizendo-se “feliz, mas não totalmente”, em razão da condenação de petistas como José Dirceu e José Genoino, afirma que a vitória no segundo turno das eleições será a redenção.
“Para que minha alma possa ser lavada plenamente do ponto de vista pessoal, neste momento, é garantir os segundos turnos.” Ele mora em Santo André (SP) e é dono de uma consultoria.
Folha – Como o sr. se preparou para o dia do julgamento?
Professor Luizinho – Eu estava com minha mulher, era aniversário dela, estávamos juntos em um canto mais isolado porque a gente queria acompanhar só nós dois juntos. Toneladas saíram das nossas costas.
Após sete anos de espera, como o sr. recebeu a notícia de que havia sido absolvido? Fico muito feliz, não totalmente feliz, mas estou muito feliz. Uma coisa é certa, esses sete anos deixaram marcas que nunca sairão.
O sr. está decepcionado com as condenações?
No caso do Genoino, do Dirceu, do João Paulo Cunha. Para mim, de verdade, acho que teve mudança na jurisprudência para poder garantir que eles pudessem ser condenados. Comigo, a falta de provas possibilitou que eu tenha esse resultado. Genoino tem razão de estar abatido. Não é possível uma pessoa que teve sua vida em risco para garantir que o Brasil tivesse a democracia plena que está vivendo hoje ser cassado, condenado.
Nesse processo de democracia, da forma como foi feito, com pressão da imprensa, da oposição, é uma violência. Respeito a decisão do Supremo, mas querer que eu concorde com ela? Não posso, com ela não vou concordar nunca. Temos processos anteriores em que pessoas foram inocentadas porque se adotou outro caminho.
No caso do sr., então por que houve absolvição?
Sempre fui um articulador do governo lá dentro [Câmara] e sempre articulei para garantir que os projetos do meu presidente, do meu governo, fossem aprovados. E sempre fiz isso às claras, com a imprensa na porta da minha sala. Falava com a imprensa, e a imprensa sabia quais eram os parâmetros que eu adotava. E sempre acredito que a imprensa nunca teve nenhuma dúvida, porque acompanhou toda minha atuação lá dentro. E no processo isso nunca foi posto em jogo, não é? Como eu poderia estar envolvido em um processo cujo pressuposto era a compra de votos? Sendo líder do governo, eu era quem conduzia as votações, se eu não votasse a favor do governo perderia o meu cargo. Estranho era estar dentro do processo. Mas o Supremo recompôs a razão.
A princípio, o julgamento parece não ter afetado o desempenho do PT nas urnas?
O povo acompanhou esse processo diuturnamente, mas o povo percebeu que tinha coisas estranhas. Tem um pouco daquele sentimento semelhante daquela coisa, da mulher, da namorada, que possui um sexto sentido. O povo possui esse sexto sentido. Está percebendo: “Tá muito carregado isso aqui”.
Então a população deu um voto de confiança ao PT?
O povo pensa: “Um partido que nos tira de situação de desencontro, que honra, que pode não ter feito tudo na intensidade que queria, mas que fez, que demonstrou que tentou fazer, que está fazendo”. No governo Lula, é inegável a revolução, do miserável que deixou de ser miserável, dos pobres que deixaram a ser pobres. O povo pensa: “Não é possível”. É o sexto sentido do povo, dá nisso. Na oposição há uma elite rancorosa com o PT, que não aceita que o operário tenha conseguido fazer. Ou não tinham vontade ou competência. Ou é inveja mesmo. Para que minha alma possa ser lavada plenamente do ponto de vista pessoal, neste momento, é garantir os segundos turnos. A vitória, que isso aí ajuda a lavar nossa alma.

STF disciplinará restrições de informações processuais

Do site Última Instância: Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) iniciaram, na Sessão Administrativa da última quarta-feira (28/3), a análise de nota técnica proposta pelo presidente da Corte, ministro Cezar Peluso, acerca do acesso interno e externo a dados processuais da Corte, principalmente no que diz respeito a informações sigilosas que, uma vez divulgadas poderiam prejudicar investigações em andamento.
A análise não foi concluída em razão de pedido de vista formulado pelo ministro Luiz Fux, após as manifestações dos ministros Marco Aurélio e Ayres Britto, contrários a quaisquer restrições de acesso às informações, exceto as decorrentes de previsões legais, como, por exemplo, quando o processo envolve direito de família e menores.
Em maio próximo, entrará em vigor a Lei 12.527/2011, que regulamenta o acesso à informação por todos os cidadãos como direito e garantia fundamental, previsto no artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal. Embora a lei aponte como primeira diretriz a observância da publicidade como regra e do sigilo como exceção, “há determinadas informações que, em razão de sua natureza, podem fugir do comando geral de publicidade”, esclareceu o ministro Peluso. São os casos de informações que envolvam a manutenção da segurança da sociedade e do Estado e também a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo.
Peluso esclareceu que, no que diz respeito à preservação do direito à intimidade, os Códigos de Processo Civil e Penal preveem a possibilidade de decretação de segredo de justiça e, nesses casos, o direito de consultar os autos e de pedir certidões de seus atos é restrito às partes e a seus procuradores. De acordo com a Lei 12.527/11, as restrições de acesso à informação são sempre temporárias e têm por limite o prazo máximo de 25 anos, quando envolve a segurança da sociedade ou do Estado; e de 100 anos, no caso de informações pessoais cuja divulgação atente contra a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.
No STF, os processos judiciais, independentemente do meio de tramitação (físico ou eletrônico), dados cadastrais e movimentação processual são, em regra, disponíveis por meio do site do Tribunal (acompanhamento processual).
As restrições de acesso são determinadas a partir da classificação do processo em sistema informatizado como: público (não sujeito a qualquer restrição e acessível, portanto, a partes, advogados e ao público em geral), processo em que foi decretado segredo de justiça (acessível a partes e advogados na causa) e processo sigiloso/oculto, cujo acesso é restrito a usuários internos com perfil específico.
Processos públicos
Processos eletrônicos e peças eletrônicas de processos físicos públicos podem ser visualizados pelo site do Tribunal, por meio do Portal do Processo Eletrônico, procedimento que exige credenciamento prévio e utilização de certificação digital nos padrões definidos pela ICP-Brasil. Com isso, dados e movimentação processual podem ser visualizados pela Internet. Já as ações de controle concentrado de constitucionalidade, bem como os recursos paradigmas de Repercussão Geral e as Propostas de Súmula Vinculante, por serem de interesse coletivo, são disponibilizados para consulta irrestrita pelo site, independentemente de certificado digital.
Preservação do direito à intimidade
Processos marcados como “segredo de justiça” contêm limitações para consulta pelo público externo. Os nomes das partes são abreviados na autuação e assim permanecem nas publicações de despachos e decisões (no cabeçalho); peças e documentos processuais são restritos às partes e advogados.
A movimentação processual, todavia, permanece visível, permitindo que o processo seja pesquisado por qualquer pessoa, a partir do número. Mas somente partes e advogados acessam a íntegra do processo digital e de peças eletrônicas de processos físicos, com base em certificado digital.
Manutenção da segurança da sociedade e do Estado
Nesses casos, a marcação como “sigiloso/oculto” determina restrição total do acesso externo às informações e restrição parcial do acesso interno a grupo de servidores com perfil específico (servidores da Secretaria Judiciária e servidores indicados por gabinetes de ministros). Despachos e decisões em processos sigilosos/ocultos não podem ser publicados. Não há previsão formal dos casos que devam ser marcados como sigilosos/ocultos pelo STF. As marcações são feitas, já a partir da autuação, em PPE (Prisão Preventiva para Extradição) e Extradições com pedido de prisão.
Outros casos criminais podem também ter status de sigiloso/oculto por determinação do ministro relator. A categoria é usada para impedir a divulgação de informações que possam comprometer o bom andamento de processos criminais. No caso de diligências, cuja divulgação possa comprometer seu cumprimento (casos em que haja mandado de prisão ou pedidos de interceptação telefônica, por exemplo), a Secretaria Judiciária pode juntar a peça somente depois que cumprida a diligência ou restringir o acesso a todo o processo.
Inquéritos
Como cabe ao relator do inquérito decidir sobre a decretação do segredo de justiça, o ministro Peluso determinou à Secretaria Judiciária que os inquéritos penais fossem primeiramente autuados somente com as iniciais dos investigados. Isso porque, se a Secretaria Judiciária já identificasse os investigados com o nome completo, ficaria frustrada eventual decretação de segredo de justiça por parte do relator. Assim, após a manifestação do relator os casos em que o segredo de justiça não é mantido têm as iniciais substituídas pelo nome completo dos investigados. Essa orientação aplica-se somente à classe processual Inquérito, e não atinge outras classes, como Habeas Corpus e Ação Penal.